terça-feira, 8 de janeiro de 2008

Crítica | Cinema Poderosa Afrodite (1995) Woddy Allen

Uma das possíveis apreciações deste filme de Woddy Allen, numa primeira instância, poderia ser a de uma homenagem ao drama grego por excelência: a tragédia, pelos olhos de um pós modernismo. Porém, Poderosa Afrodite, supera este simples tributo. Emprega à tragédia uma nova roupagem, adaptando-a aos seus ensejos de realizador e às próprias características do cinema. Os seus diálogos inteligentes e acutilantes, umas das marcas dos seus filmes, são revestidos de fina ironia e consistente sátira à sociedade contemporânea quando baseada nos propósitos positivistas. Veja-se os casos da hereditariedade e do contexto social que são questionados ao longo do filme enquanto factores de análise da personalidade.

A comédia, género amado deste embaixador do amor incondicional de Nova Iorque, é transversal a todo o objecto narratológico apresentado. O contraste visual da altura de Lenny Weinrib [Woddy Allen] e de Linda Ash [Mira Sorvino] é disto bom exemplo. O género cómico, sempre bem acompanhada pelo jazz de Erroll Garner, correlaciona-se, de forma surprema, na estreita ligação entre Tragédia versus Comédia. Mas também existe um distanciamento da tragédia clássica pela escolha do jazz como música contemporânea. Trata-se de uma outra homenagem: a Brecht, pelo seu conceito de distanciamento. Allen usa e abusa, de forma sublime, do jogo de possíveis relações entre este dois géneros. Com intuito de se exprimir sentimentos, emoções, e interrogações existenciais, que pertencem à universalidade, que resistem ao passar dos séculos

Ter-se-há Woddy Allen servido da Poética de Aristóteles, como quem se serve de um guia de conversação numa viagem a um mundo cuja linguagem não é a sua? Será muito estranho que assim não seja. Levando à letra o parágrafo 52 do capítulo IX deste livro fundador, segundo o qual «o que é possível é plausível.» Allen utiliza o coro clássico não da forma canónica, mas sim como lhe sugere a sua vontade. Mostra-nos, de uma forma extremamente engenhosa mas ao mesmo tempo lúcida, a adaptação do coro grego à realidade da era moderna, enquanto ensemble musical- chegando por ser, diversas vezes, o pertencente das cordas vocais da banda sonora. Manipulando um jogo em que ele próprio é, enquanto realizador, quem dita as regras, tem a ousadia de dar ao coro uma interactividade no processo narrativo. Ora à distância, num típico anfiteatro da antiguidade grega, ora a uma proximidade inovadora, pondo-o no lugar da acção. Mais, o coro revela-se, em muitos dos seus momentos, um vinculador de uma linguagem contemporânea, à qual o filme se situa.

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